Depois das fintechs, chegam ao mercado as insurtechs – iniciativas que trazem inovação tecnológica ao mercado segurador

A “segunda onda das fintechs” (iniciativas que aliam tecnologia ao setor financeiro) está chegando, e é formada pelas insurtechs – termo que vem de insurance (seguros) + technology (tecnologia) -, empresas que trazem inovações tecnológicas ao setor de seguros. Segundo o último relatório do Radar Fintech, divulgado pela FintechLab em fevereiro deste ano, existem no País 14 iniciativas ligadas ao setor, que representam 6% das fintechs mapeadas pela entidade. Em agosto de 2015, quando foi feito o primeiro levantamento, apenas duas “insurtechs” despontavam no relatório.

O movimento das insurtechs, na opinião de Gustavo Zobaran, coordenador do Comitê de Insurtechs – recém-criado pela Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (camara-e.net) – é ainda uma “marola” comparado com o que acontece nos EUA, na Europa e na Ásia, por exemplo. Com base na onda das insurtechs no exterior, Zobaran afirma que essas novas empresas chegam ao mercado para trazer tecnologia e “ajudar (o setor) a trabalhar mais com uma ótica de prevenção do que de proteção”.

“Hoje em dia, o mercado segurador do Brasil tem uma ótica mais focada em quando acontece o sinistro. A tecnologia vem muito com a ótica de prevenir que aconteça o sinistro”, explica o coordenador. Um exemplo de como as insurtechs estão trabalhando com prevenção ao redor do mundo é com a distribuição de fitbands para o monitoramento da saúde do segurado. “Se sei que o segurado está fazendo exercícios, a probabilidade de ter sinistro é menor.” A mesma lógica pode ser aplicada ao segmento automotivo com a telemetria dos veículos. “Instala-se um sensor no carro que gera um monitoramento. A seguradora enxerga o comportamento do segurado, se ele está freando muito bruscamente, andando de madrugada ou não.”

Por consequência, a precificação do seguro poderá ser personalizada, acrescenta Zobaran. “Hoje, a precificação do seguro é feita por um risco coletivo e as pessoas acabam pagando a mais por isso. A grande sacada é que, com as insurtechs, o risco será personalizado.”

Potencial

“Insurtechs são todas as iniciativas digitais dentro do mercado segurador que têm como objetivo a transformação e revolução do setor por meio do uso da tecnologia aliada a uma nova e marcante experiência para o consumidor”, diz, por sua vez, Eldes Mattiuzzo, diretor da Youse, plataforma de vendas de seguros on-line da Caixa Seguradora, criada em 2016. “No Brasil, o mercado de insurtechs ainda é bastante novo, mas com um potencial imenso a ser explorado, com novas iniciativas disruptivas que surgem todos os dias”, continua. Segundo Mattiuzzo, a Youse é a primeira iniciativa em que é possível fazer a contratação do seguro de maneira 100% on-line, via celular ou desktop, e customizar a apólice, definindo as coberturas e assistências desejadas e o valor de cada uma.

Para o diretor, o setor de seguros está passando por transformações, e nesse cenário, surge um novo consumidor. “São indivíduos que nunca tiveram uma relação muito próxima com a contratação de um produto de seguro e que dificilmente tomariam qualquer decisão de contratação da maneira tradicional. São pessoas que acreditam na tecnologia como algo fundamental para a evolução e inovação do mundo e fazem o uso frequente no seu dia a dia, principalmente por meio de aplicativos e serviços online.” Mattiuzzo ressalta, ainda, que há espaço no mercado tanto para iniciativas tradicionais quanto para as disruptivas. “Vale salientar que há mercado para todos os players que operam no setor de seguros privados e que é necessário respeitar a diversidade de escolha dos consumidores. O papel da Youse é o de expandir o mercado segurador e captar esse novo perfil de clientes.”

A CNseg (Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização) considera as insurtechs “aliadas” cujas inovações tecnológicas complementam os processos tradicionais das seguradoras. “As empresas tecnológicas que estão surgindo no mercado de seguros trazem uma revolução para o modelo de negócios tradicional, o que na maior parte das vezes resulta em aumento de produtividade e em uma consequente redução de custos e esforços”, declara Therezinha Vollú, gerente Operacional da Superintendência Executiva de Negócios da CNseg. Ela cita, inclusive, que a entidade está investindo nessas startups. “É um investimento que fornece apoio financeiro, mas também auxilia a entrada das empresas no mercado.”

A reportagem também entrou em contato com a Susep (Superintendência de Seguros Privadas) para repercutir o assunto, mas não teve retorno até o fechamento.

Regulação e confiança do consumidor são desafios

A Mutual Life, de Vitória (ES), quer trazer ao setor de seguros uma mudança “um tanto quanto radical”, como definiu o próprio CEO, Jó Beduschi, que comanda o negócio ao lado de Fabrício Matos, CTO. “Queremos levar a proteção peer-to-peer para o mercado de seguros”, diz ele. A ideia é prover uma plataforma para pessoas com “perfis similares de risco e interesse” se unirem e se protegerem mutuamente, explica Beduschi, formando espécies de associações de ajuda mútua. Os membros do grupo fazem o pagamento do seguro – fixado por um cálculo atuarial – apenas uma vez, mas fazem o rateio para repor o fundo cada vez que um dos participantes se utiliza dele após um sinistro.

De acordo com Beduschi, dessa forma é possível pagar menos pelo seguro (até 40% menos) e conseguir a indenização em menos tempo. A recomendação é que o prazo para a indenização seja de menos de cinco dias. “Quando você pede a indenização do seguro, existe uma burocracia muito grande e consegue o dinheiro em até três meses. As seguradoras ganham negando o seguro. Mas a Mutual Life não tem o interesse em não pagar. Os grupos são autônomos e não influenciamos sobre as suas decisões.” Conforme Beduschi, os recursos não ficam sob os cuidados da plataforma. “A grande inovação é que tudo funcione baseado em blockchain”, destaca o CEO. A tecnologia, utilizada pelas moedas virtuais, proporciona proteção e transparência às transações. “O grande problema das associações de ajuda mútua é a assimetria das informações”, explica Beduschi. “O que resolve (o problema da assimetria) é a transparência.”

Divulgação

Jó Beduschi (em pé) e Fabrício Matos (sentado), sócios da Mutual Life: insurtech de Vitória (ES) quer levar mais transparência ao setor de seguros com tecnologia utilizada por moedas virtuais

Regulação

Para o coordenador da camara-e.net, Gustavo Zobaran, um dos desafios a serem enfrentados pelas startups do mercado de seguros é a regulação do setor. “Temos o desafio de ajudar o órgão regulador (Susep) a ter uma nova visão.” Outro desafio é conquistar a confiança do consumidor, “assim como aconteceram com as fintechs”, observa Zobaran. “Mas eles quebraram isso justamente com um jeito diferente de atender as pessoas e com serviços diferentes. As insurtechs vão passar por isso e as que terão sucesso são aquelas que vão conseguir uma identificação com o seu público.”

O CEO Jó Beduschi, da Mutual Life, também vê a regulação como um desafio, já que, atualmente, não existe previsão em leis de empresas que atuam nos moldes da empresa de Vitória. Nos EUA, na Alemanha e na Rússia, no entanto, já existem casos similares, adianta ele. “Sem a menor dúvida entendemos que o mercado tem aderência aos nossos produtos, mas o grande problema é a regulação. Não existe ainda nada específico sobre seguro peer-to-peer, seja com blockchain ou não. Mas o negócio, tomando corpo, tem que ser regulado. O que esperamos é criar uma justificativa para que ele seja regulado.” Na visão de Eldes Matiuzzo, da Youse, entretanto, a regulação atual já “permite que iniciativas como a Youse operem em total conformidade com a legislação, com a introdução de novas tecnologias em produtos e uma experiência 100% online de se contratar um seguro”.(M.F.C.)

Mie Francine Chiba

Fonte: Blog Brasil em Ação

Transformação digital no setor de seguros

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